Entrevista do fundador da ONG Núcleo de Cultura Indígena, Aílton Krenak, para o www.producaocultural.org.br —Produção Cultural no Brasil
Esta entrevista faz parte do projeto Produção Cultural no Brasil. Alguns direitos reservados.
Aílton Krenak
Fundador da ONG Núcleo de Cultura Indígena
Íntegra da entrevista, gravada no dia 24 de junho de 2010 no estúdio Cine & Vídeo, em São Paulo (veja a entrevista em vídeo clicando em http://www.producaocultural.org.br/slider/ailton-krenak/)
Meu nome é Aílton, Aílton Krenak. Este Krenak é o nome da minha família indígena de lá do Vale do Rio Doce, Minas Gerais. Os krenaks são um grupo de aproximadamente umas 100 famílias que sempre viveram ali na região do médio Rio Doce e o meu trabalho tem sido sempre, de alguma maneira, de vincular esta cultura extremamente local de lá do médio Rio Doce com os nossos vizinhos.
A partir de uma coisa que nós temos chamada Núcleo de Cultura Indígena, que é uma iniciativa que nós começamos há 20 anos atrás - a de apropriar novas tecnologias, tipo internet, Ponto de Cultura, para algumas regiões na floresta -, nós estamos concluindo agora uma ação legal que é a de formatar junto com pessoas de diferentes culturas, de diferentes lugares da Amazônia, pegando o Mato Grosso, Rondônia, Acre, Roraima, formatar com eles espaços que vão estar localizados dentro destas aldeias, onde as pessoas locais, na sua própria língua, na sua cultura local, vão poder interagir numa rede chamada Rede Povos da Floresta. Tem desde meninada, assim, de 15 anos, 16 anos, que estão começando a pegar uma câmera, máquina fotográfica, ou estes meios digitais todos, e que já estão editando, estão começando a saber o que é uma ilha de edição. Tem oportunidade de todos juntos, numa espécie de feira de cultura, de ir mostrar a produção que essa rapaziada, esse pessoal está fazendo em 30 localidades diferentes da Amazônia.
O secretário de Cultura do Estado de Minas Gerais me chamou em julho, agosto do ano passado: "Krenak, o governo vai iniciar uma série de ações agora de promoção da cultura e tem um segmento aí que a gente quer abordar, que são as comunidades indígenas, sei lá, fazer um seminário, chamar os antropólogos...". Eu peguei e falei com ele assim: "Sei lá, este papo de seminário, chamar um antropólogo, chamar não sei o quê, isso me parece uma visão tão clínica, tipo assim: 'Ah, estou com uma dor aqui, vou no médico para perguntar o que eu tenho'". Quando você pensa no caso, digamos, que é a minha praia, que é a dos índios, o meu sentimento é que a conversa é com um por um. Os krenaks não são iguais aos xavantes, nem igual aos bandeirantes, nem igual aos ianomâmis. Eu sou krenak, mas eu não posso achar que eu sei o que é legal para os guaranis, entendeu? Pergunta para os guaranis.
Se a minha guerreira cultural tiver que reconhecer alguma capacidade local, alguma potência numa ação local, a primeira coisa que ela vai fazer é procurar saber se aquela ação local é capaz de produzir o pão de cada dia. O pão de cada dia pode ser dançar, cantar, mas, na minha percepção, na minha apropriação da palavra, a guerrilha cultural significa só que você não está enquadrado. E como você não esta enquadrado, você não tem, digamos, um programa que pode ser adaptado para política pública da cultura, você não quer subsidiar um programa de política pública de cultura, o que você quer é continuar alimentando a capacidade infinita de reinventar, de revolucionar, de virar um negócio ao avesso - que tem que ser a expressão da cultura porque senão vira acomodação.
FONTE:http://www.producaocultural.org.br/wp-content/themes/prod-cultural/integra/integra-ailton-krenak.html
segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
Cinema feito por índios cresce e se consolida no Brasil
Diretores falam sobre o trabalho, que só é possível graças ao projeto Vídeo nas aldeias, de Vincent Carelli
Walter Sebastião - EM Cultura
Existe um cinema novíssimo: os filmes feitos pelos cineastas indígenas. São documentários sobre o cotidiano das aldeias, memórias das comunidades, eventos importantes das tribos. Que vêm recebendo prêmios no Brasil e no exterior. Movimento que, no Brasil, data do fim dos anos 1990 e teve como berço o projeto Vídeo nas aldeias. Mas, no mundo, surgiu a partir do fim dos anos 1970, com trabalhos na Nova Zelândia, Austrália, Canadá, Alasca, México, Bolívia, realizados basicamente pela primeira geração de índios que frequentou a escola, a cidade e a universidade.
Kene Uxi, As voltas do Kene acaba de ganhar menção honrosa no Forumdocbh, importante mostra mineira dedicada ao cinema documental. O diretor do filme é Zezinho Yube, de 27 anos, da comunidade huni kui, território indígena Praia do Carapanã, aldeia Mibayã, no Rio Tarauacá, Acre. Agente agroflorestal, ele já realizou, desde 2005, quatro outros filmes: Novos tempos; Manã Bai, A história do meu pai; Katxa nawa, Festa da fertilidade; Já me transformei em imagem. Em dezembro, começa a edição de A festa da iniciação. Todos com trechos no YouTube.
LEIA MAIS
Projeto Vídeo nas aldeias registra a memória de olho no futuro
“O prêmio é reconhecimento do nosso trabalho. Temos muitos cineastas e filmes de qualidade. Está crescendo o espaço para realizadores indígenas”, conta Zezinho Yube. O cinema, para ele, é ferramenta de comunicação e expressão, com significado político, que tem proporcionado intercâmbio entre as aldeias. “Estamos fazendo trabalho de revitalização cultural”, afirma, satisfeito em ver revalorizadas festas e pinturas corporais, além do orgulho de ser índio, entre outras coisas. Sua obra é toda documental e já foi exibida em Nova York, no Museu do Índio, e em Washington (EUA).
Zezinho conta que, às vezes, pensa em realização de obra de ficção baseada na história de seu povo. Está trabalhando com o irmão em projeto de criação de ponto de cultura, visando à aquisição de equipamentos. Desafio posto aos cineastas, para o diretor, “é resistir, com a nossa cultura, a nossa língua, do jeito que somos, a um entorno que quer nos dominar, nos manipular”, explica o fã de Glauber Rocha.
Missões Ariel Ortega tem 24 anos, é guarani, nasceu em Missiones (Argentina). Mora em Jacuí (RS), é professor bilíngue, tem trabalho com jovens. Já dirigiu o curta Nós e a cidade e um média-metragem premiado: Duas aldeias, uma caminhada. Está realizando mais dois filmes, um sobre a espiritualidade (que, observa, é característica de seu povo) e outro sobre as missões jesuítas, onde existe uma grande aldeia que, além do Brasil, chegava ao Paraguai e à Argentina.
“Os filmes trazem nosso ponto de vista, a sabedoria dos guaranis e fortalecem a nossa cultura”, observa Ariel. Conta que, desde criança, está acostumado a ver brancos filmarem índios – “é sempre tudo feito rápido”. Avisa que as crianças precisam ver os filmes dos cineastas indígenas até para não chegarem à aldeia imaginando que se vive hoje como há 200 anos. Sonhos? “Um grande filme sobre a criação do mundo segundo os guaranis”, conta. Superprodução? “Sim”, responde, contando que vários, nas aldeias, têm jeito de ator. A obra teria narração do avô Dionísio Duarte, até hoje, aos 82 anos, considerado o cacique geral dos Mbya.
O que ver
• Coleção de DVDs Cineastas indígenas: antologia da produção de autoria indígena dos últimos 10 anos.
• Índios do Brasil : Dez programas para TV, apresentados por Ailton Krenak, mostrando como vivem e o que pensam os índios de nove povos (entre eles os maxacalis, de Minas, disponíveis para download.
• O programa A’Uwe exibe filmes de vários núcleos de produção indígenas. Domingo, às 18h30, na Rede Minas.
FONTE: http://www.divirta-se.uai.com.br/html/sessao_8/2010/12/05/ficha_cinema/id_sessao=8&id_noticia=31967/ficha_cinema.shtml
Walter Sebastião - EM Cultura
Existe um cinema novíssimo: os filmes feitos pelos cineastas indígenas. São documentários sobre o cotidiano das aldeias, memórias das comunidades, eventos importantes das tribos. Que vêm recebendo prêmios no Brasil e no exterior. Movimento que, no Brasil, data do fim dos anos 1990 e teve como berço o projeto Vídeo nas aldeias. Mas, no mundo, surgiu a partir do fim dos anos 1970, com trabalhos na Nova Zelândia, Austrália, Canadá, Alasca, México, Bolívia, realizados basicamente pela primeira geração de índios que frequentou a escola, a cidade e a universidade.
Kene Uxi, As voltas do Kene acaba de ganhar menção honrosa no Forumdocbh, importante mostra mineira dedicada ao cinema documental. O diretor do filme é Zezinho Yube, de 27 anos, da comunidade huni kui, território indígena Praia do Carapanã, aldeia Mibayã, no Rio Tarauacá, Acre. Agente agroflorestal, ele já realizou, desde 2005, quatro outros filmes: Novos tempos; Manã Bai, A história do meu pai; Katxa nawa, Festa da fertilidade; Já me transformei em imagem. Em dezembro, começa a edição de A festa da iniciação. Todos com trechos no YouTube.
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“O prêmio é reconhecimento do nosso trabalho. Temos muitos cineastas e filmes de qualidade. Está crescendo o espaço para realizadores indígenas”, conta Zezinho Yube. O cinema, para ele, é ferramenta de comunicação e expressão, com significado político, que tem proporcionado intercâmbio entre as aldeias. “Estamos fazendo trabalho de revitalização cultural”, afirma, satisfeito em ver revalorizadas festas e pinturas corporais, além do orgulho de ser índio, entre outras coisas. Sua obra é toda documental e já foi exibida em Nova York, no Museu do Índio, e em Washington (EUA).
Zezinho conta que, às vezes, pensa em realização de obra de ficção baseada na história de seu povo. Está trabalhando com o irmão em projeto de criação de ponto de cultura, visando à aquisição de equipamentos. Desafio posto aos cineastas, para o diretor, “é resistir, com a nossa cultura, a nossa língua, do jeito que somos, a um entorno que quer nos dominar, nos manipular”, explica o fã de Glauber Rocha.
Missões Ariel Ortega tem 24 anos, é guarani, nasceu em Missiones (Argentina). Mora em Jacuí (RS), é professor bilíngue, tem trabalho com jovens. Já dirigiu o curta Nós e a cidade e um média-metragem premiado: Duas aldeias, uma caminhada. Está realizando mais dois filmes, um sobre a espiritualidade (que, observa, é característica de seu povo) e outro sobre as missões jesuítas, onde existe uma grande aldeia que, além do Brasil, chegava ao Paraguai e à Argentina.
“Os filmes trazem nosso ponto de vista, a sabedoria dos guaranis e fortalecem a nossa cultura”, observa Ariel. Conta que, desde criança, está acostumado a ver brancos filmarem índios – “é sempre tudo feito rápido”. Avisa que as crianças precisam ver os filmes dos cineastas indígenas até para não chegarem à aldeia imaginando que se vive hoje como há 200 anos. Sonhos? “Um grande filme sobre a criação do mundo segundo os guaranis”, conta. Superprodução? “Sim”, responde, contando que vários, nas aldeias, têm jeito de ator. A obra teria narração do avô Dionísio Duarte, até hoje, aos 82 anos, considerado o cacique geral dos Mbya.
O que ver
• Coleção de DVDs Cineastas indígenas: antologia da produção de autoria indígena dos últimos 10 anos.
• Índios do Brasil : Dez programas para TV, apresentados por Ailton Krenak, mostrando como vivem e o que pensam os índios de nove povos (entre eles os maxacalis, de Minas, disponíveis para download.
• O programa A’Uwe exibe filmes de vários núcleos de produção indígenas. Domingo, às 18h30, na Rede Minas.
FONTE: http://www.divirta-se.uai.com.br/html/sessao_8/2010/12/05/ficha_cinema/id_sessao=8&id_noticia=31967/ficha_cinema.shtml
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